Moradores do Loteamento São José, no Bairro João Bosco Pinheiro, em Cuiabá, vivem uma corrida contra o tempo para reverter a decisão judicial que determinou a desapropriação e demolição de mais de 100 residências no local.
A decisão, assinada em 27 de janeiro de 2025 pelo juiz Antonio Horácio da Silva Neto, titular da Vara Estadual de Meio Ambiente (Vema) e do Juizado Volante Ambiental (Juvam) da Comarca de Cuiabá, estabelece um prazo de 90 dias para que as famílias desocupem os imóveis, construídos em áreas públicas, incluindo áreas verdes e de preservação permanente (APP).
A Ação Civil Pública foi ajuizada pelo Município de Cuiabá em 2016 contra 11 moradores do loteamento. No entanto, atualmente, há mais de 100 residências na região, cuja ocupação começou há quase três décadas.
A advogada Marinalva de Matos Santana, que defende os moradores, explicou que ainda há possibilidade de acordo para evitar a remoção dos moradores. Eles já iniciaram um abaixo-assinado.
“O efeito [do abaixo-assinado] é chamar a atenção das autoridades para intervirem a favor dos moradores, pois, juridicamente falando, o que cabe agora é uma apelação de sentença, muito bem elaborada pela Defensoria que atua no caso, visando provocar um acordo junto ao Município de Cuiabá, que é o autor do processo por meio da Procuradoria-Geral do Município”, explicou a advogada.
Ela é assessora do vereador Jeferson Siqueira, que promoveu uma audiência pública sobre o caso. Segundo a advogada, o prazo para esse recurso vai até 26 de março de 2025.
Desespero total
A diarista J.M.da S.A., de 33 anos, é uma das moradoras que podem perder sua casa.
“Se sair daqui, não tenho para onde ir. Muita gente não está nem conseguindo dormir, o clima está bem tenso. O pessoal corre atrás do abaixo-assinado, mas muitos não dão atenção, viram a cara”, disse.
A Prefeitura afirmou ter notificado os moradores para desocupação, mas as determinações não foram cumpridas. A diarista, que mora no local desde 2011, disse que nunca foi notificada e soube do caso apenas pela imprensa, após a decisão de janeiro.
“Tem idosos, crianças autistas, crianças com TOD (Transtorno Opositivo Desafiador). Meu filho tem TOD, já está adaptado à escola, recebendo acompanhamento, saiu agora o neurologista para ele. E do nada vamos ter que sair?”, questionou.
“Se a gente não recorrer, nossas casas vão ser demolidas sem receber nenhuma indenização, nenhuma moradia, nada. Aqui já está regularizado, tem asfalto, pagamos água, energia... No ano passado ou retrasado até praça inauguraram. Não é grilo, alguns moradores têm até título”, completou.
A principal alegação do município é que as construções são irregulares e causam degradação ambiental. J.M.da S.A., no entanto, garante que a situação da região melhorou desde que os moradores chegaram.
“Estava cheio de lixo, o povo jogava até bicho morto, era cheio de entulho. A Prefeitura não cuidava. Entramos e começamos a cuidar, hoje está muito melhor do que antes”, afirmou.
“A gente deu não só nosso suor, demos nosso sangue ali. Dia, noite, madrugada trabalhando pra hoje ter nosso conforto”.
De acordo com a decisão, a Defensoria Pública Estadual chegou a solicitar a possibilidade de regularização fundiária, mas o Município de Cuiabá, à época, alegou inviabilidade para o processo.
O prefeito Abilio Brunini (PL) afirmou que está tomando medidas para reverter a decisão judicial e impedir que as famílias sejam despejadas.
A advogada explica que o prefeito pode “promover o diálogo entre as partes, visando a adoção de medidas que contemplem a regularização fundiária e a implementação de medidas de compensação ambiental”.
Para ela, a regularização fundiária é uma solução viável e justa, que legaliza áreas ocupadas de forma irregular, integrando-as à cidade de maneira organizada.
“Tal medida não apenas assegura a titulação dos ocupantes, mas também promove a melhoria das condições de vida dos moradores, respeitando a função social da propriedade e o direito à moradia”, concluiu.