Os generais sentiam inveja de Bolsonaro por ter o suporte do voto, de milhões de votos. Pela base popular que poderia assegurar, mesmo na derrota, o lastro para um eventual projeto de ditadura.
Um tenente violento, insubordinado, inconfiável e medíocre virou presidente com 57,8 milhões de votos em 2018. Teve mais 58,2 milhões em 2022 e quase se reelegeu.
Os generais, mesmo os não golpistas, o invejavam porque o tenente se apresentava como uma inovação da extrema direita brasileira. Reproduzia aqui o fenômeno que se propagava pelo mundo, na Turquia, Hungria e Polônia.
Um regime autoritário, com um déspota que nega até vacinas e é aplaudido, poderia ser exercido por alguém eleito. Não era preciso ter o comando de um regime militar ditatorial apenas pela força, como no século 20, no modelo inaugurado por Floriano Peixoto, outro medíocre, no golpe de 1889 contra Pedro II.
Bolsonaro era o exemplar verde-amarelo do novo autoritarismo com voto. Mas perdeu a eleição, e os generais apostaram na hipótese de usá-lo como pretexto e elo para o próximo passo, agora via golpe. Um regime à antiga, porque eles, que estiveram no poder, sentiram que isso seria possível.
Usariam todos os argumentos conhecidos de fraude na eleição e da necessidade de retomar o poder para exercê-lo com moralidade, com a família e com Deus acima de tudo. E com os militares para impor a ordem e conter o comunismo.
Não deu certo. O que os generais têm agora é a granada que Bolsonaro carregava desde 2018. Sem o pino, sem voto, sem apoio popular e já sem o mesmo respaldo das elites. Sem a velha direita sequestrada pelo fascismo e sem parte da imprensa agora tarcisista.
O Bolsonaro que poderia viabilizar uma ditadura, após a eleição perdida, e ser depois descartado, arrasta os militares para perto da cadeia. Só agora, nos indiciamentos, arrastou 25. Vai arrastar mais.
Vai levar junto, se o sistema de Justiça não fraquejar de novo, grandes empresários, alguns notórios sonegadores e lavadores de dinheiro. Gente impune, que sempre escapa dos cercos da polícia, do Ministério Público e Judiciário, finalmente seria alcançada.
Os planos de todos eles, de um governo totalitário, talvez mais cruel do que o iniciado em 1964, não existiria sem Bolsonaro e seu alicerce de milhões de votos. Com Bolsonaro, mesmo que apenas como laranja, eles teriam base popular.
Mas o Bolsonaro que os seduziu é o mesmo que afunda as Forças Armadas na maior crise, não necessariamente moral e ética, porque nem isso é novidade, mas de imagem mesmo, por incompetência, covardia e ausência de liderança.
O cenário é desolador. O golpe de 64, liderado por Castello Branco, teria agora uma réplica liderada por Augusto Heleno e Braga Netto, com a ajuda de oficiais incapazes de transmitir confiança aos próprios golpistas.
Há nos registros do relatório da Polícia Federal uma marca nas manifestações dos militares envolvidos. São rasos, simplórios, transitando entre a tolice e a idiotia.
Bolsonaro contaminou os militares com a sua mistura de arrogância e ignorância. E teve o suporte que merecia, com uma das piores safras de generais da República.
O que esses generais têm agora diante deles é um Bolsonaro caindo aos pedaços, sem voto, desmoralizado pelo golpe fracassado, inelegível, frustrado pelas derrotas dos seus candidatos na eleição municipal e cada vez mais perto da prisão.
Bolsonaro talvez não existisse sem o lastro dos militares que o tutelavam. Mas os militares que o bajularam deixam de existir sem ele. Ambos se esfarelam porque foram fracos, incompetentes, desastrados e covardes. E agora todos são perdedores.
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